terça-feira, 24 de abril de 2012

Depressão e Transformação

A depressão é classificada pela publicação de Classificação Internacional das Doenças - o CID-10, dentre os Transtornos de Humor. Apresenta-se sob diferentes formas clínicas que compreendem alterações no estado de humor ou afeto, sejam o rebaixamento ou "subida" do mesmo. O episódio da depressão propriamente dita varia em grau e intensidade, de leve a severo, que pode ser determinada pelo número de sintomas. Dentre estes sintomas destaca-se a diminuição do humor, redução de energia e diminuição da atividade.

Todos sabemos que negligenciar a saúde mental tem sido uma prática da nossa sociedade. Essa negligência está presente há muito tempo mundialmente, em diversas classes sociais. Saúde mental e - consequentemente - depressão, é um assunto tabu em muitas famílias da nossa era, como foi o câncer alguns anos atrás, e que acaba virando segredo familiar. Em uma pesquisa recente, a Dra. Gro Harlem Brundtland apontou que quanto maior o faz-de-contas ou a postura individual de ignorar o estresse emocional, maior será a probabilidade desse mesmo indivíduo ser afetado por uma psicopatologia.

Sabendo disso, que tal nos informarmos e buscarmos ajuda profissional sobre o tema? Há muito material a respeito da depressão, são inúmeros livros e revistas que tratam desse assunto, a maioria deles sempre enfatizando o ponto de vista fisiológico. Mas é bom lembrar a todos que quando o assunto é a psique criativa a visão puramente fisiológica não é suficiente. Nós somos mais do que matéria, somos também psique, que em grego significa alma.

Partilho da visão junguiana, que entende que corpo e psique estão bastante conectados e fechados entre si para encontrar em um mesmo sintoma a doença e a cura. O que quero dizer com isso ao leitor é que esse mal-estar da alma humana encontra respostas às suas dores em si mesmo. Podemos ser resgatados do que nos aflige através do que nos aflige. Parece compreensível que para acontecer a transformação psíquica - que poderíamos chamar também de "maturidade" - em um nível mais elaborado, um chamado precisa ser feito desde os níveis mais profundos da psique, que se não for atendido voluntariamente vai acabar aparecendo através de um sintoma.

A depressão, como uma perspectiva da Alma, vem atender a esse chamado. Em outras palavras, está a cargo da Alma (Psique) a "descida aos infernos para a posterior redenção":


A alma volta constantemente às suas feridas para extrair delas novos significados; volta em busca de uma experiência renovada. Ficamos familiarizados com nossos complexos e nosso sofrimento. O ego, identificado com o arquétipo do herói, chama a repetição de neurose. Mas na repetição, na circularidade, o ego é forçado a conscientizar-se de que há uma outra força governando a coisa toda. Na repetição o ego é forçado a servir à psique. Há um aspecto ritual aqui, uma humilhação. A circularidade, por fim, nos personaliza. Do ponto de vista da alma, a repetição é uma maneira de nos tornarmos aquilo que somos (BARCELLOS, 1991).


Deprimir, "profundar" segundo o dicionário Aurélio quer dizer: "Tornar fundo ou mais fundo; escavar; pesquisar, perquirir, entender, ou compreender perfeitamente, penetrar". Dito isto, lembramos novamente que a tendência do ser-humano é o crescimento e a universalização e que um dia alcançaremos seres e condições que parecem distantes, mas que para isso precisamos primeiro conquistar a nós mesmos.

Para finalizar, tenhamos em mente que a depressão é uma oportunidade de transformação e que também é uma resposta da nossa alma a tanta superficialidade e "mania de grandeza" que pode estar governando você. O aprofundamento em si mesmo através da depressão é uma tentativa de auto-cura. Encontra-se aqui a importância da psicoterapia como facilitadora do reencontro do paciente em depressão com o significado perdido, de efeito transformador.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Trabalho com os Sonhos


Uma das principais técnicas da psicoterapia junguiana é o trabalho com os sonhos. Expressão da psique como um todo, os sonhos revelam as diferentes dimensões da vida do cliente, seus conflitos, a origem desses conflitos, seu prognóstico e apontam o caminho para cura.

Mesmo que você não esteja em análise no momento, já pensou em anotar seus sonhos em um "diário"? Sim, esse hábito é muito saudável e nos ajuda a compreender melhor nosso psiquismo. Independente da ajuda de um analista, você mesmo pode ver a evolução dos personagens, roteiros, símbolos e situações que se delineiam na sua tela mental enquanto você dorme. 

É muito comum que ao despertar tenhamos a memória viva do que sonhamos e minutos depois tudo desaparece, acontece que quando entra o "intelecto" (nossos pensamentos, interpretações, impressões sobre o que sonhamos) os símbolos vão ficando difusos. Por isso, nada mais valioso do que manter uma caderneta ao lado e anotar, depois você pensa sobre o que sonhou e faz suas avaliações. 

Em algumas culturas contemporâneas da África os sonhos têm um valor premonitório e também de "mediador" das relações. Os Griot no Senegal, por exemplo, acreditam que o sonho da noite anterior é que determinavam como a pessoa deveria se comportar naquele dia: o que vestir, o que comer, o que fazer, os animais da pessoa, as plantas, etc. Para que a Sacerdotisa interpretasse seus sonhos, os habitantes daquela vila faziam de tudo para sonhar. Caso contrário, uma grande desgraça poderia acontecer. Em outras culturas dali, durante o café-da-manhã os familiares se reúnem e cada um conta o que sonhou durante a noite, os sonhos são discutidos pelo grupo e assim as decisões são tomadas naquela coletividade. 

E é ainda mais interessante quando pensamos nas antigas civilizações: para os egípcios os sonhos eram mensagens dos deuses, para os chineses ao adormecer as almas encontravam-se com os mortos e os sonhos seriam lembranças desses encontros, para os gregos os encontros dos sonhos eram com os deuses. Bem, esse hábito precioso se perdeu na cultura ocidental racionalizada ao extremo, mas vem sendo resgatado pela Psicologia Analítica e outras correntes teóricas que prezam pelo símbolo.

A FUNÇÃO GERAL DOS SONHOS É A DE COMPENSAR,  através dos sonhos temos uma balança psicológica, que favorece o nosso equilíbrio psíquico. Dessa forma, além de compensar conteúdos da personalidade global do indivíduo, os sonhos podem ainda atuar com uma função premonitória: “Se o aviso dos sonhos são rejeitados, podem ocorrer acidentes fatais" (Jung,1964).

Agora pode ser que você se pergunte, do que adianta o analista acompanhar meus sonhos se eu mesmo posso fazê-lo? Bem, além do fato de o analista ter as prerrogativas teóricas e técnicas para o auxílio no bem-estar global dos seus pacientes - não somente para a análise do sonho, este profissional entende a imagem do sonho como a melhor expressão daquilo que não conhecemos e por isso pode auxilia-lo bastante durante sua jornada em busca de si mesmo. As imagens que chegam a nós como representativas do mundo exterior são exatamente as mesmas usadas pela nossa psique para exprimir nosso mundo interior.

O inconsciente se comunica com a dimensão consciente através de imagens, sendo anteriores à própria linguagem verbal. Assim, nunca deixem de ter em conta que a comunicação que os sonhos estabelecem conosco cada noite constituem um modo bastante significativo de expressão espontânea do inconsciente. Não perca a oportunidade de escutar os seus!