quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Os músculos e o corpo como reduto.


O corpo paradoxal.
Sim, o corpo é nosso porto seguro. Através disso, quero dizer a vocês que é pelo corpo que nos apreendemos, nos organizamos, manipulamos, transformamos, sobrepassamos como indivíduo no meio dos demais, seja por meio de cirurgia, terapias, drogas ou uma força estóica. Ele está ali como testemunho da nossa história, é o corpo que nos permite gravar ou medir as transformações pelas quais passamos - até mesmo sociais. Essa é uma ideia que vem sendo estudada e aparece bem no livro "Historia del cuerpo" (Corbin, Courtine e Vigarello), mais claramente no capítulo "El siglo XX". 

A partir disso, quero considerar o corpo masculino e as exigências do fisiculturismo. É difícil julgar ou classificar como não saudável um hábito que, ainda que pareça obsessivo, transpira saúde. Vemos nos anúncios desse público algo que se assemelha aos ascetas! Sim, não se surpreenda, aos ascetas. Os praticantes dessa cultura compreendem que para ter a mente sã, não haverá outro meio senão trabalhar em seu próprio corpo, em sua "mortificação" (sim, porque há dor!) e disciplina. É a transcendência por um "algo maior".

"An animal in the ring, a monster in the gym".
(Um animal no ringue, um monstro na academia)
No entanto, aqui entra minha questão: o que seria esse algo maior para o qual se rendem os fisiculturistas?  A uma necessidade estética? Particularmente eu diria que não, pois muitas vezes seus corpos chegam a se assemelhar a uma máquina. Ao seu altar interior? Narciso? Parece-me que os seus corpos são a materialização de um domínio ideológico e subjetivo ao mesmo tempo.

O corpo do fisiculturista não teme as contradições espelhadas nele próprio! Esmerando-se cada dia pela perfeita similitude com um animal ou uma máquina (vide capas de revistas).
Mas além da linha tênue que encontramos na prática do fisiculturismo, existe aqui também uma dimensão ignorada por muitos que é a da transgressão. A partir de certo ponto, o corpo do fisiculturista  já não admite "representar algo" ou "mascarar", como no caso do post anterior sobre o corpo feminino. Ele está ali como um pedaço de carne e simplesmente é. Dessa forma, esse corpo atinge dimensões que chocam e transgridem. 

Termino essa reflexão com uma lógica proposta por Beatriz Ferrús, ainda que o fisiculturismo traga um continuum de um corpo docilizado e disciplinado, por outro lado é uma hipérbole que ameaça, dado seu caráter indizível e paradoxal. Seus corpos têm o caráter de estar a ponto de irromper. Esse é só mais um exemplo do nosso corpo como possibilidade de atuação, de confronto e de não adequação e ao mesmo tempo de porto seguro do nosso ser, reduto da nossa subjetividade - tanto para os adeptos do fisiculturismo, como para os mais sedentários mortais. 

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